20 de outubro de 2018

Quando um mundo cabe no quintal


Do alto dos seus 1,50 metro, Derlane Melo, apesar de não ter uma estatura das maiores, com certeza não passará despercebida pelos locais nos quais transite. O rosto jovial aliado ao carisma de educadora e animadora infantil, atraem a atenção para uma figura que até poderíamos rotular de 'pequena', mas, sem sombras de dúvidas, se trata de mais uma "pequena notável".

Nessa entrevista concedida aos poucos através dos meios digitais, devido à loucura de sua agenda, Derlane, ou Tia Déh (como é conhecida na sua versão 'animadora') falou sobre sua vida, sua arte e seus sonhos, e revelou que, bem mais do que um negócio, no seu Quintal valiosa mesmo é a diversão. Vamos conferir?



Qual a sua formação e que profissão você sonhava exercer?
A princípio fui matriculada por minha mãe no curso Científico do Ensino Médio, ela não queria que eu seguisse a sua profissão, que era de professora. Porém, antes mesmo de iniciar o curso eu troquei para o Magistério.

Isso por que você sonhava em ser professora?
Na realidade não, eu sonhava mesmo era em ser cantora.

Então você começou numa área bem distinta do seu sonho. Qual sua formação hoje?
Tenho licenciatura em Biologia, especialização em Docência Educacional e atualmente estou cursando Pedagogia como portadora de diploma.

Você também pensava em trabalhar com crianças ou isso foi acontecendo por acaso?
Não me recordo de ter pensado na possibilidade de trabalhar com crianças, mesmo com o fato da minha infância ter sido maravilhosa, daquelas em que se vive a fase intensamente, pois brinquei de tudo que podia e ainda mais um pouco. Acho que o encanto por crianças realmente aconteceu quando me deparei sendo professora, exercendo o dia a dia da função. Foi uma junção da criança que eu fui com a criança que eu passava a ter para cuidar e ensinar. Eu queria que ela fosse amada e estimulada a ter uma infância como a que eu tive, com recordações incríveis.




Foi esse sentimento que lhe levou a criar o Quintal da Diversão?
Ah, o Quintal! Me sinto feliz demais ao falar dele. Ele tem uma história tão especial que sempre desejei ter a oportunidade de contar para as pessoas como ele surgiu. Por isso agradeço a oportunidade hoje de contar nossa história aqui. Ele nasceu em uma época em que eu mais precisava, quando estava com um problema de saúde. Em minhas orações sempre pedia a Deus para não ficar dependente de remédios e terapia, pois não queria isso pra mim.

Meu tio tinha uma casa em Nazaré da Mata em que ele só vinha nos finais de semana e nem todos. Ela tem um quintal lindo. A primeira ideia que tive foi de aproveitá-lo para dar aulas particulares, mas logo senti que não era o que eu queria. Sempre fui uma professora que nunca gostou dos métodos tradicionais, sempre preferi o diferente, o lúdico. Daí comecei a confrontar a infância que eu tive com a de hoje, com a influência dos celulares, tablets, computadores e da televisão. Então me veio a ideia do brincar, do se divertir.


É triste as crianças de hoje em dia não saberem o que é pular corda, jogar amarelinha, pega-congelou e tantas outras brincadeiras incríveis ditas hoje como 'de antigamente'. E eu sempre me questionava por que elas são encaradas assim? Então passamos a fazer essas brincadeiras lá e, quando fui pensar no nome, queria unir o quintal ao que eu apresentava lá. Então tive a ideia: Quintal da Diversão. Acho que esse nome representava tudo que vivíamos lá.



Posso dizer que o Quintal me ajudou muito, pois eu estava realizando algo que para mim era fundamental: ver aquelas crianças terem uma infância, ou pelo menos uma parte dela, igual à que eu tive. Criança sendo criança. E o melhor de tudo é que parecia que o tempo nunca tinha passado, que eu nunca tinha deixado de ser criança também.



Foi difícil tirar a ideia do papel e colocá-la em prática?
Não posso negar: no começo senti medo, mas acreditei. Sempre fui uma pessoa de ter ideias, de sonhar. Às vezes exagero, sonho alto... Acho que quando você ama o que faz, sai tudo diferente, sabe? E quando você tem ao seu lado pessoas que acreditam no seus sonho e ideias, se sente estimulado a fazer as coisas serem diferentes. É isso que me faz acreditar que eu posso sempre mais, pois essas pessoas sempre me orientam e dialogam comigo na hora de colocar as ideias em prática. O olhar de quem está de fora te dá uma outra visão da coisa, geralmente mais realista.





Hoje o Quintal está como você idealizou ou ainda tem planos pra ele?
Acredito que ele está se encaminhando para o que eu idealizo, pois estou num espaço que é meu. Nos mudamos recentemente para o novo endereço e devo relatar que estou muito feliz. Novas ideias estão sempre surgindo e logo analisamos a possibilidade de elas saírem do papel. Só que tenho muitos e muitos planos ainda e quero colocá-los todos em prática.

Confesso que não esperava que o Quintal conquistasse o sucesso nem o público que tem hoje. Só tenho a agradecer e repetir que quando você ama o que faz, se sente realizado com o seu trabalho e o resultado não pode ser diferente. Não escolhi a minha profissão como uma opção, mas sinto que foi um dom. Acho que lá na infância maravilhosa que tive, a semente foi plantada e regada, vindo florescer hoje.

O que é mais difícil quando se trabalha com crianças? E qual a melhor parte?
A pior parte é termos que competir com a tecnologia que está aí. Hoje em dia, o ato de brincar livremente, sem nenhum aparelhinho, está perdendo toda a importância. No meu ponto de vista, as crianças não estão curtindo a infância como deveria ser. É como se elas não soubessem pular, partilhar, se relacionar umas com as outras, esperar sua vez e o pior: aceitar ganhar ou perder! Muitos pais acham melhor os filhos ficarem presos aos seus tablets, no seu mundo particular e isso chega a doer. Na minha infância, eu chamava meus amigos para irmos brincar no quintal da minha casa.

Então, qual a infância que você quer resgatar?
Se for parecida com a minha, já está de bom tamanho. Lembro como se fosse hoje: montávamos um espetáculo para representar o circo, era muito divertido. Minha casa sempre estava cheia: roupas, sapatos, maquiagens; minha mãe flagrava suas coisas fora do lugar quando voltava do trabalho e não dizia nada, pelo contrário, ela me incentivava. Nunca ouvi minha mãe reclamar disso, ela acreditava nas minhas ideias e se divertia com as minhas invenções.




A melhor parte do meu trabalho é quando vejo o que foi pensado e programado dar certo. A alegria da criança em participar das atividades, de ser criança de verdade, de ter infância, de chegar pra você e falar: "Eu queria morar nesse quintal. Ele parece um parque de diversões!". Isso me emociona e dá a certeza de que o trabalho realizado atingiu seu objetivo. O dinheiro não paga isso, pois essa memória está sendo gravada na memória de sua infância e vai durar por toda a vida.


Tenho certeza que, lá na frente, essa criança vai poder dizer: "Eu tive infância e ela foi maravilhosa!" e vai se lembrar de mim com um carinho que não tem preço. Esse é meu maior objetivo. Quero que as crianças tenham infância, sejam felizes e se tornem adultos realizados no que fazem como hoje eu sou, amando minha profissão.





Veja também:

Entrevista com o grupo Os Nazarenos

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